O dia estava bonito. A brisa do amor e o tempero matinal combinaram perfeitamente com o sunshine que invadia o quarto, pela pequena janela. Não tinha vento e nem fazia muito calor. O dia estava apenas bonito.
Inspirado pelos detalhes de uma manhã sensualmente acolhedora, resolvi pensar no que me levava a tratá-la como tal. Pensei em música, comida, sexo, mulheres, bebida, amor. Pensei em todas as coisas que realmente me importo. Tirando o amor.
Enquanto pensava, a minha mente censurava aquela maneira de vida. Era de manhã cedo. Eu estava fisicamente mal, mas minha mente estava pura e feliz. Como uma manhã. Os pensamentos estavam trotando, soltos, livres, sem contextos. E pela primeira vez eu me senti limpo.
Deitado na cama, fitei a janela sem mesmo abrir os vidros. Dali, deitado, eu vi o mar. Vi as pessoas caminhando na areia. Vi o Sol batendo na água. Vi o céu. Vi tudo o que antes eu nem me atentava em ver. Parecia tudo muito novo para mim. Eram coisas diferentes, que aconteciam sobre freqüências oscilantes
Eu estava sentindo outras vibrações. As vibrações estavam isentas das lembranças. Aliás eu estava oco delas. Era uma manhã como toda manhã deveria ser. Sem lembranças. Apenas sentidos . Abrir os olhos e começar a viver. Sentido o tempo. O vento. O sol. Aprendo a olhar o mundo como se nunca o tivesse conhecido. Assim deveria ser todas as manhãs. Do jeito que esta foi.
Mas as manhãs passam e são quebradas pela tarde. Pelas preocupações. Pelos problemas. Pelas pessoas. Pela falta de sentido. Pela falta de amor. As tardes me trazem lembranças. E lembranças me trazem o passado. E o passado me traz a minha vida.
A manhã estava acabando e eu começava a lembrar. Era tudo o que eu não queria. Lembrei que no dia anterior eu abdicara à minha liberdade, o meu dinheiro e o meu amor por uma mulher. Lembrei também que naquele dia eu queria muito fazer tudo o que fiz, não necessariamente no tempo em que fiz. Lembrei que eu tinha me dado conta que era cedo demais...para casar.
Fiquei feliz por uns instantes, por não lembrar se o tinha feito. A final, quem não lembra do próprio casamento? Se eu não lembro é porque não fiz. Mas as lembranças continuaram vindo. E a manhã ia terminando. Eu estava lembrando até como se escreve um bom conto. Estava lembrando como se descreve uma história. Estava tentando me recompor.
Casamento. Festa. Música. Mulher. Sexo. Bebida. Sexo. Bebida. Ressaca. Nesta ordem. Eu acabara de lembrar das coisas que compunham a minha vida, e que por instante, durante a bela manhã, eu julguei ser fruto dos meus prazeres intuitivos.
Tirando o casamento, o resto eu podia repetir muitas e muitas vezes. Até porque a minha vida era assim: sem sensações, apenas repetições, na tentativa de fazê-la mais adorável. E foi tentando que eu me casei. Me casei para fugir da rotina. Me casei para dar um sabor diferente aos momentos vividos.
Penso que me enganei. Se pudesse dar um gosto a todos os momentos da vida, diria que eles se resumem em três: as manhãs têm gosto de mel. As tardes têm gosto ardente. As noites têm gosto de leite. Hoje prefiro o sabor do mel.